Scortecci Editora - Poesia - Formato 14 x 21 cm - 1ª edição - 2017 - 96 páginas
O Sal e o LírioFrancisca G. Vilas Boas
Em nível crítico literário, corroboro, não sou de rasgar seda mesmo porque Francisca G. Vilas Boas não precisa de elogios gratuitos e impressionistas. Por isso sinto-me à vontade para afirmar que Palavras e Sombras, seu livro anterior, é um dos melhores que li nos últimos anos. E reafirmo aqui as razões dessa assertiva. Há no livro um lirismo maduro, criador de imagens translúcidas inusitadas, bem definidas na linguagem que tece metáforas enredantes de sentido profundo. Trata-se de um livro poeticamente competente. Nele tem-se a lírica comprometida com a verdade do sentimento. As imagens, como paisagens numa janela, estão a “espicaçar sombras com a luz”. Linguagem aberta como enigma: tudo a ver, desde que se descubra o véu da metáfora. A poeta tem razão, ela “dá de comer a absurdos”, trabalha prefixos de vocábulos que geram estranhamento. Sombra é, no livro, heterônimo da sua verdade: “onde há morte há sombras”. Muitos versos carregam um sentido ontológico: “o vazio é prenhe”, “página sem memória”. Assim como o desfecho dos poemas “Hoje preciso morrer”, “Cantiga do dia”, “Retrato”, “O que veste para depois desnudar”. Nenhuma palavra é usada em vão, a (des)dizer metáforas na ordem da surpresa da linguagem. Exemplo: “O olhar à espreita se transforma no que vê”, “Câimbras beliscam ondas inquietas”, “A estrela a fugir desnuda palavras”. Francisca bateia palavras inusitadas que acendem significados surpreendentes no contexto frásico do verso: esgarabulhos – sizígia – cajila, entre outras. Livro sinestésico, às vezes um grito em surdina junto às sombras que pensam. Palavras e Sombras é merecedor do conhecimento dos mais exigentes leitores de poesia. O livro ficou – e é! – bonito em todos os aspectos. Márcio Almeida - Professor de Literatura e crítico literário